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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Pátria de Chuteiras e Botinadas

Pátria de Chuteiras e Botinadas

A apropriação dos gostos populares para fins políticos sempre ocorreu na história da humanidade e ainda acontece até hoje seja através da música, das representações artísticas de forma geral e no esporte, atividade esta na qual o texto que segue irá se focar sobretudo no futebol e como tal relação com a política se estabelece no Brasil.
   A estreita relação política com  futebol sempre ocorreu não apenas em nosso país e não somente no que se refere particularmente a este esporte. Os regimes de excessão e as ditaduras fazem uso frequente desses expedientes no intuito de conter os ímpetos de cobrança de melhores condições de vida da grande maioria da população. Na Itália Facista e na Alemanha Nazista por exemplo os esportes foram extremamente utilizados como propaganda política. Um dos fatos mais emblemáticos que endossam o poder do regime nazista foi quando Hitler negou-se a entregar a medalha de ouro ao campeão olímpico de corrida Jesse Owens porque o atleta era negro.
   No Brasil é de praxe sacramentar que a ditura militar se aproveitou dessa imagem de país vencedor da Copa do Mundo para justificar semos os “maiores” em tudo. O desenvolvimento econômico era  constantemente comparado ao futebol. A imagem mais significativa desse período é o presidente Médici utilizando um uniforme de jogador de futebol ensaiando uma embaixada enquanto muitos brasileiros contrários do regime eram torturados e mortos pelo próprio governo. Mas não foi apenas a ditadura militar que se aproveitou do sucesso esportivo. Em 1958, ano em que o Brasil foi campeão mundial, Juscelino Kubitscheck também discursava junto ao seus “cinquenta anos em cinco” apropriando-se da vitória brasileira do campeonato mundial para mostrar o quanto o país era moderno. Até Getúlio Vargas também deu sua contribuição, de modo que podemos afirmar que a imagem do país do futebol, da “pátria de chuteiras”  foi programada tacitamente ao correr das décadas.
   No ano que segue o Brasil sediará a Copa do Mundo e ainda que hoje o país esteja governado por um regime político em tese democrático, o mesmo fará uso do estabelecimento do evento para discursar que o país está em plena expansão
econômica e social o que justifica a realização da Copa do Mundo aqui.  Entretanto, o que ocorre na verdade é o mascaramento das enormes dificuldades para realizar o evento. Não há aeroportos suficientes, faltam estádios e muitos estão ainda inacabados, há ausência de transporte público em quantidade e qualidade, isso para não falar de escassez de energia elétrica e água. Há ainda a falta de segurança. A premência em se realizar o que ainda resta fazer abre margem para a acusação de negligência e estímulo a corrupção, mola mestra dessa estrutura que favorece acordos escusos com empreiteiras, licitações às pressas ( quando essas ocorrem ) e uma série de negociatas que virão à tona ao término da copa.
   Ainda que hoje tenhamos manifestações de rua aos borbotões, inclusive contra a realização da Copa do Mundo no Brasil, desacredito que tais atos sejam tão somente desacordos populares advindo da massa da população insatisfeita. Não é à toa de que cogitou-se pagamento em dinheiro para alguns manifestantes – aqui a política de pão e circo por um outro ângulo. Num ano eleitoral tudo acaba sendo arquitetado como instrumento político, pró ou contra o governo.  Se por um lado a população de certa forma tem reagido contrária ao desperdício de dinheiro em obras de infraestrutura para tal evento, de outro  a grande mídia têm-se mostrada conivente com o governo pois exibe-se muito pouco acerca da enorme desorganização do evento nos jornais e nas redes de televisão, o que levanta a questão do verdadeiro interesse das mídias para que o evento aconteça ( audiência, anunciantes ). Ou seja, vivemos um momento do apogeu do capitalismo selvagem em que cada classe está extremamente preocupada com seus interesses, sejam eles econômicos ou de obtenção e manutenção de poder, mas nunca com o verdadeiro bem estar social.
   E por último, mas não menos importante é o que denominarei de talento individual dos atletas como fator determinante. Explico: ainda que fatores externos influenciem o resultado de uma partida de futebol ou mesmo de um campeonato mundial tem-se uma “carta na manga” que é o talento individual do jogador de futebol. Há quem diga que mesmo o futebol é um jogo de cartas marcadas e podemos considerar tal assertiva verdadeira até certo ponto. Desde a escolha das chaves as seleções que compõe quanto os lugares onde se realizarão os jogos. Como ilustração lembro-me de certa vez em que aconteceu um jogo amistoso da seleção brasileira que foi realizado no estado do Maranhão e transmitido pela Rede Globo, num dia que excepcionalmente a novela terminaria antes de seu horário habitual para a exibição do evento. Um pouco antes da novela o Jornal Nacional noticiava uma suposta candidatura da maranhense Roseana Sarney para a presidência. “Juntando os pontos” compreende-se o porquê do jogo no mesmo estado da futura candidata.( É claro que a candidatura não decolou após denúncias de corrupção do governo da filha de José Sarney, mas isso é outra história).
   Resumindo, ainda que se  planeje todo um aparato ideológico, na prática o atleta pode não efetuar o resultado esperado e toda consequência positiva da Copa não passar de quimera. O país  está numa encruzilhada: se se vence o campeonato mundial continuará a política de pão e circo de sempre, com a falsa ideia de desenvolvimento econômico etc;  se o Brasil perde a Copa poderemos perceber com mais clareza a recessão que irá se seguir, afinal em ano de Copa do Mundo o país trabalha menos e todo o gasto realizado para as obras da Copa agora é apenas gasto, não é investimento, ou seja, esse dinheiro não irá retornar aos cofres públicos com a mesma rapidez com a qual saiu. Muda-se o governo, fala-se de outros países, mas a maneira como se faz para manter o controle das massas é usado desde há muito tempo e ainda continuará mais um tanto, enquanto não houver governantes compromissados com as verdadeiras necessidades sociais. 

2 comentários:

  1. Fábio, concordo com tudo. Perfeito e perspicaz. Só não acredito que seja o capitalismo selvagem o grande vilão da história. A corrupção é o carro chefe, como você bem disse, isso independe de sistema, é o pacote Brasil: ame-o ou ou dane-se. Porque dinheiro pra deixá-lo não temos....
    Parabéns pelo texto!!!!

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    1. Vou falar dessa selvageria que é a gana pelo poder, seja em qual plaga do mundo. Abraços!

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