drops rock

domingo, 20 de janeiro de 2013

A Esposa


Minha memória busca fatos

Da noite de meus tempos

Cabelos trançados,

Mamãe queria-os assim.

 

Saia, sem ser mini

Vida sem ser maxi

Um pouco de maquiagem

Batom num brando tom

 

No florir de primaveras

Desabrochava bonita e cobiçada

Pecado retribuir!

Meus quinze anos ainda jovens demais

Mesmo em quinze minutos!

O coração batendo a cento e cinquenta

Mesmo com o tesão que o bico do seio aguenta.

 

Eis que uma porta ouviu fofoca

Minha boca calou-se num beijo

O beijo da traição

Vieram matriarcais: surra e sermão

“Isso não são modos de moça de família!”

Queria saber quando iriam me deserdar.

Terminei colégio

Consegui trabalho

Respirei fumaça de fábrica

E a liberdade de casa

Com vinte e um anos a saia encurtou

E alguém me piscou.

 

Sim, este poderia beijar.

Era doutor

E eu me curara da delinquência juvenil.

 

Veio namoro

E nas veias o fogo.

 

Conheci as núpcias antes da lua de mel,

O casamento depois do motel.

 

Tão longe da vista da vizinhança

Poderia desfrutar alguma lambança

Cortei minhas tranças

Remocei esperanças

Não era criança

Pois no ventre já trazia uma

Casei-me precedendo parto

Minha mãe nem sonhava com o fato

 

Depois de tempos corridos

Algo me encheu de tristeza

Cheguei numa crucial incerteza:

“ou o casamento era ruim

Ou não era para mim”.

 

Trabalho deixei de ir

Ciúme, talvez demais

Minha silhueta atraia demais

E agora pia, tanque, fogão

Não podia ver manicure, não

 

E meu marido “tudo” me dava:

Joias e sedas caras, perfumes

Embora sequer pro futebol me convidasse.

Inda assim, retribuía

 Afinal, eu tinha um lar, família

Filho e máquina de costura que infelizmente não cerzia coração rasgado.

 

Para ter tudo apenas precisava dar parte de mim

Eu não passava de uma prostituta

 Uma filha da...

Minto!

A própria puta.

 

 

Oh! Destino cruel e surpreendente!

Casei-me com um doutor que me deixava doente.

Meu homem me dava o mundo

Mas me tirava da Terra.

 

Se eu soubesse ser esse meu fim

Teria encurtado saia na juventude

Brincos de argola, batom escarlate, rímel e Rouge.

E nem me preocuparia

Mamãe se desesperaria

 

No entanto fui fraca

Vendi-me por tão pouco

Vendi-me sem conhecer meu valor

E hoje pago pelo meu desamor

Sou mulher de vida fácil

Na dificuldade de ser santa

Abri mão de anseios

E hoje carrego dor em meu seio

 

Sei, será meu fim

 E já está na hora de preparar o jantar

Sou forte quando choro

Cebola cortada faz chorar...

Um comentário:

  1. Com este poema eu fui premioado em Primeiro lugar na categoria de interpretação - ( na verdade ele foi interpretado e a atriz tirou o maior prêmio ) - no XIII Festival de Poema, Crônica e Conto de Imperatriz - Maranhão. Foi Premiado ainda no 5° certame " A Palavra em Prisma" no município de Guarulhos - São Paul em 2007.

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